Como um tatuador jaraguaense devolve autoestima a mulheres após câncer de mama
Foto: Arquivo Pessoal
“O que você vê quando se olha no espelho?” Para muitas mulheres que passaram por uma mastectomia, essa é uma pergunta dolorosa. As marcas deixadas pelo câncer de mama vão muito além da pele, atingindo a identidade, a autoestima e o direito de se reconhecerem inteiras. Mas em um estúdio de Jaraguá do Sul, um tatuador tem reescrito essas histórias com tinta, empatia e arte.
Acácio Dalsochio, de 40 anos, dedica parte do seu tempo para devolver a mulheres o que a doença tentou tirar: a sensação de completude. Com mais de duas décadas de experiência com a agulha, ele oferece gratuitamente tatuagens de reconstrução de aréolas mamárias para mulheres que enfrentaram o câncer de mama.

A ideia que virou missão
O projeto nasceu da observação atenta da esposa de Acácio, Madriane. “Ela notou o quanto esse tipo de tatuagem faria sentido, após uma amiga que faleceu de câncer em 2007, Fabiana Machado, radialista de Jaraguá do Sul, comentou que ninguém fazia esse trabalho aqui em Santa Catarina e sugeriu que deveríamos começar de forma voluntária”, lembra o tatuador.
A maioria das mulheres, explica ele, acaba desistindo do procedimento por conta do custo, que pode ultrapassar R$ 1.800.
“A gente conhece muitas mulheres que passaram por isso. Familiares, amigas… Quando você percebe que pode ajudar de forma tão direta, não tem como ignorar”, diz ele. A partir disso, Acácio decidiu que não cobraria um centavo de quem buscasse reconstruir não só o corpo, mas a dignidade.

Um encontro entre coragem e arte
Nesses quatro anos de projeto, em torno de 600 mulheres passaram pelo estúdio de Acácio. Muitas chegam inseguras, emocionadas, mas todas saem com algo novo: um motivo para sorrir diante do espelho.
Conteúdos em alta
“Tem uma frase que nunca esqueci. Uma cliente me disse: ‘faz mais de dez anos que eu não me olho no espelho’. E quando ela se viu depois da tatuagem, chorou. A gente chorou junto”, conta.
O processo de reconstrução é delicado e exige que a mulher tenha passado pelo menos um ano desde a cirurgia, para garantir uma boa cicatrização. O desenho é feito com técnica realista, com sombras, texturas e pigmentos específicos para imitar com perfeição a aréola natural.
Quando a autoestima vira tratamento
Embora não substitua cirurgias reconstrutivas, a tatuagem tem um efeito emocional poderoso. “Não é só estética. A mulher sente que venceu, que se refez. Ela não está cobrindo uma cicatriz, está encerrando um ciclo”, explica Acácio.

A cada atendimento, ele vê de perto como a arte pode ser terapêutica. E, apesar da carga emocional envolvida, garante que o trabalho é também um presente. “Elas acham que eu estou fazendo algo por elas, mas elas fazem muito por mim. Saio melhor depois de cada história que ouço aqui.”
Uma rede que se forma com empatia
O projeto de Acácio ganhou alcance boca a boca. Algumas mulheres são encaminhadas por médicos, outras por grupos de apoio ou por amigas que já passaram pelo estúdio. Não há divulgação formal, redes sociais ou formulários. É no compasso da escuta e da empatia que o trabalho se expande.
Ele não exige exames, comprovantes ou burocracias. Basta a história. “Se ela me diz que passou por isso, é o suficiente. Eu não estou aqui para duvidar de ninguém, estou aqui para somar”, afirma.
Arte que toca onde a medicina não alcança
Acácio sabe que sua atuação não substitui o trabalho dos médicos, mas reconhece que, em muitos casos, é ele quem encerra um ciclo que ficou pendente. “A cirurgia salva a vida. Mas o espelho, o corpo, a identidade… Isso quem devolve é o cuidado. E se posso fazer parte disso, já vale a pena.”

Seu estúdio, hoje, não é apenas um local de trabalho. É também um espaço de escuta, acolhimento e renascimento.
Como isso impacta sua vida?
O câncer de mama é uma realidade que assusta, marca e transforma, mas, em Jaraguá do Sul, o trabalho de Acácio Dalsochio mostra que empatia, arte e solidariedade têm poder de curar onde a medicina já não consegue mais fazer sua parte. Essa história também nos lembra que pequenas iniciativas, quando guiadas por propósito, podem mudar o dia a dia de uma cidade. E que o espelho pode ser, sim, um lugar de vitória.
Max Pires
Já criei blog, portal, startup… e agora voltei pro que mais gosto: contar histórias que fazem sentido pra quem vive aqui. Entre um café e um latido dos meus cachorros, tô sempre de olho no que importa pra nossa cidade.