Cansado e relutante, ele virou Papai Noel e viveu um Natal que mudou sua vida
Imagine chegar de viagem, cansado… e descobrir que você é o Papai Noel do hospital. Foi o que aconteceu com Marcelo, em Jaraguá do Sul. E o que parecia incômodo virou um dos momentos mais marcantes da sua vida.
Presente de Natal
Aquele Natal foi o mais imprevisível de todos. Sempre fui bastante metódico para organizar as minhas férias de final de ano, afinal, costumeiramente me desloco mais de 900km, para confraternizar com a família.
Naquela época, meu carro não tinha ar-condicionado, não lembro qual das duas opções usei na viagem: ir com as janelas totalmente abertas e chegar quase surdo ou abri-las parcialmente e derreter no calor. O que sei é que cheguei muito cansado, depois de quase 12 horas.
Mal coloquei os pés na calçada, depois dos abraços, minha mãe comunicou:
– Marcelo! Vou precisar de ti, daqui a pouco?
– De mim, pra quê?
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Em tempo, minha mãe fez toda a sua carreira profissional na Santa Casa. Começou limpando o piso e chegou a enfermeira-padrão, como se chamavam antigamente as enfermeiras graduadas. Era tão novinha, que precisou “recalcular” a data de nascimento, ficando um ano mais velha, para ser admitida. Pelo menos usa essa idade “oficiosa” até hoje.
– Marcelo! Tu não vais acreditar… a pessoa que seria o Papai Noel do hospital desistiu.
– Mãe, acabei de chegar…
– Ótimo, ainda dá tempo.
– Mãe, não vou. Estou muito cansado.
– Agora não tem o que fazer, já dei o teu nome lá.
– Como assim? Eu não disse que iria…
– Nem precisa né Marcelo! Já esqueceste de quantas festas de final de ano, passaste no hospital. Tinha Papai Noel, lá? Tinha né?
– É uma festa?
– Dessa vez não é festa. Vais ser o Papai Noel que visita TODOS os leitos do hospital.
– Todos os leitos?
– Sim. Em festa tu já foste bastante lá. Lembras de quantos presentes já recebestes nos encerramentos dos funcionários?
– Mas, mãe, eu estou de férias…
– E aquela bolsa branca da associação dos funcionários que tu usavas pra ir pro treino de futebol? Saiu de onde? Lá do hospital.
Desisti de tentar escapar do “compromisso”. Tirei as malas do Gol Bolinha vermelho e fui vestir a roupa, que estava num cabide, ou seja, realmente eu já era o Papai Noel da Santa Casa, há muitas horas, e nem sabia.
Vesti a roupa, coloquei um travesseiro na barriga, para disfarçar meu peso insuficiente para o cargo, a barba postiça e fui para o hospital.
Já comecei a me arrepender da minha relutância, quando vi os sorrisos, dos outros voluntários que representavam um presépio e ficaram muito felizes quando cheguei.
Começamos a peregrinação pelas alas do hospital. As pessoas ficavam emocionadas com a comitiva. Os pacientes idosos me olhavam como se fossem crianças. As mães dos recém-nascidos faziam questão que eu pegasse as crianças no colo.
Eu carregava um saco de mini panetones que ia distribuindo para as pessoas. Os pacientes com doenças muito contagiosas, nos abanavam das portas dos quartos. Quando entrei na UTI, fui orientado pela chefe, a dizer “Feliz Natal”, baixinho para cada paciente.
Até que cheguei num leito, com uma moça, aparentemente muito debilitada, com a cor amarelada, imóvel. Resolvi deixar um panetone, do lado dela.
Me olhou, e quando eu disse “Feliz Natal”, piscou os olhos três vezes e sorriu.
Foi o meu presente de Natal inesquecível.
Marcelo Lamas, cronista. Autor de Papo no cafezinho, Indesmentíveis, entre outros.
marcelolamasbr@gmail.com
Marcelo Lamas
Marcelo Lamas Cronista, autor de 4 livros. Sou gaúcho radicado em Jaraguá, há 3 décadas, porém, estou mais para jaraguaense, nascido no RS. Frio, doces, cafés, gatos, livros, futebol e Coca-Cola são as minhas preferências.