Da anta ao puma: 15 animais de Jaraguá do Sul que estão ameaçados de extinção
A vida selvagem de Jaraguá do Sul está em risco, veja quais espécies lutam para viver.
Em meio às paisagens que fazem de Jaraguá do Sul uma das cidades mais verdes de Santa Catarina, há um alerta que cresce em silêncio: parte dessa vida está desaparecendo. Espécies que antes faziam parte do cotidiano da mata hoje sobrevivem escondidas, ameaçadas pela perda de habitat, atropelamentos e pela presença cada vez maior do homem em seus territórios.
Para entender o que ainda resiste e o que está em risco, o JDV acompanhou o biólogo Gilberto Ademar Duwe, diretor da Fujama, em uma caminhada por áreas preservadas do município. Foi no ritmo calmo da floresta que as histórias começaram a surgir.
O chão da floresta está úmido. Galhos estalam a cada passo e o som distante de uma araponga corta o silêncio. À frente, o biólogo Giba guia o caminho com passos tranquilos, como quem conhece cada árvore de memória. “Aqui a gente ainda encontra vida, mas é uma vida que está resistindo”, ele diz, com o olhar fixo no verde fechado.
As câmeras que revelam segredos da mata

Enquanto caminhamos por uma área de preservação, Giba aponta uma pequena estrutura metálica presa ao tronco de uma árvore. “Aqui dentro tem uma câmera fotográfica. É ela que mostra o que o olho humano não vê”, explica. Essas armadilhas registram imagens noturnas e ajudam a comprovar a presença de animais que raramente aparecem diante das pessoas.
“Cada nova foto é uma surpresa”, conta o biólogo. “Às vezes passam semanas sem nada. Aí, de repente, surge uma anta atravessando a trilha, uma jaguatirica caçando ou um puma observando o entorno.” Ele fala com o brilho de quem ainda se encanta com o trabalho, mesmo depois de décadas.
“Quando uma câmera flagra um animal ameaçado, a gente sente que a floresta ainda respira. Cada registro é uma lembrança de que a natureza insiste em permanecer, mesmo quando tudo ao redor parece querer silenciá-la.”
Conteúdos em alta
Esses registros confirmam que Jaraguá do Sul ainda mantém porções de mata madura capazes de abrigar grandes predadores. “A presença do puma é um sinal poderoso”, diz Giba. “Onde ele vive, o ecossistema ainda está de pé.”

Além desses, o levantamento da Fujama inclui o Pixoxó, o bugio-ruivo, o tamanduá-mirim, o veado-catingueiro, o macuco, a araponga e a cuíca-d’água.
Cada um, à sua maneira, cumpre uma função que mantém a floresta viva, seja polinizando, controlando insetos ou regenerando o solo. “É um equilíbrio delicado”, explica Giba. “Esses animais sustentam o ciclo da vida na mata. Quando um deles some, tudo começa a desandar.”
O felino invisível: gato mourisco

De pelagem parda e olhar arredio, o gato mourisco é um dos felinos mais difíceis de ver. Vive solitário e prefere caçar à noite. Giba conta que só o viu duas vezes em campo, e ambas pelas lentes das armadilhas fotográficas. “Ele é o símbolo do que temos e do que podemos perder sem perceber”, diz.
O felino depende de áreas amplas e contínuas de floresta, mas o avanço das estradas e loteamentos corta seu caminho e aumenta o risco de atropelamentos. Cada nova imagem dele é uma vitória silenciosa da natureza jaraguaense.
A beleza que observa na sombra: jaguatirica e puma

Mais adiante, Giba mostra uma pegada marcada na terra. “Aqui passou uma jaguatirica”, aponta. A marca é recente, nítida, e o tamanho denuncia: não era um gato doméstico. A jaguatirica é ágil, bela e desconfiada. Caça pequenos mamíferos e aves, mantendo o equilíbrio do ecossistema. “Ela e o puma são fundamentais”, explica. “Eles controlam populações e garantem o funcionamento saudável da natureza.”
“A presença do puma mostra que ainda temos áreas bem conservadas aqui em Jaraguá. É um felino que só vive onde o ambiente está inteiro, onde ainda há silêncio, alimento e espaço. Quando o puma aparece, é a própria floresta dizendo que ainda está viva.”
Ambos são discretos, mas indispensáveis. Ver suas pegadas é um lembrete de que ainda existe vida selvagem na cidade, e que ela precisa de espaço para continuar existindo.
A força tranquila da anta: o jardineiro da floresta

“Essa é a mais bonita de todas”, comenta Giba, enquanto exibe uma foto de anta captada pela Fujama. O maior mamífero terrestre da América do Sul é também o grande jardineiro da floresta. Espalha sementes por onde passa, ajudando na regeneração natural da mata. “Sem a anta, a floresta perde força para se renovar”, explica.
Mas ela paga um preço alto por sua lentidão e curiosidade. Muitos dos resgates realizados pela Fujama envolvem antas atropeladas em rodovias da região. Ainda assim, cada registro vivo é sinal de esperança: de que ainda há espaço para coexistência.
O porco-do-mato queixada: o bando que move a floresta
O queixada se move em bandos numerosos e barulhentos. “Quando passa, parece uma tropa marchando”, brinca o biólogo. São os engenheiros do solo: revolvem a terra, dispersam sementes e fertilizam a mata. A presença deles mantém a floresta ativa e renovada.
Mas esses bandos ficaram raros. A caça, embora menos frequente, e a fragmentação da mata reduziram seus territórios. O silêncio onde antes havia passos pesados é o retrato de uma natureza cada vez mais isolada.
O pequeno e essencial: gavião-pombo-pequeno

Entre as copas mais altas, um vulto silencioso cruza o ar. O gavião-pombo-pequeno é uma das aves mais raras da região — e também uma das mais ameaçadas. Com plumagem clara e voo firme, ele parece um pombo à distância, mas é um predador ágil e discreto, guardião invisível do equilíbrio da floresta.
“É um dos símbolos do que ainda resiste na Mata Atlântica”, comenta Giba. “Ele depende de áreas de mata fechada, e onde o gavião-pombo ainda vive, é sinal de que o ambiente está saudável.”
A ave se alimenta de pequenos répteis, anfíbios e insetos, ajudando a controlar pragas e a manter o ciclo natural. Sua presença, embora difícil de registrar, é motivo de comemoração entre os pesquisadores da Fujama.
Caça em declínio, atropelamentos em alta

Durante décadas, a caça foi o maior inimigo da fauna jaraguaense. Hoje, a história começa a mudar. “A caça diminuiu muito, e isso tem favorecido o reaparecimento de várias espécies”, comemora Giba. É um sinal de que as ações de conscientização e fiscalização estão surtindo efeito.
Mas outro problema, mais moderno e silencioso, ganhou espaço: os atropelamentos.
“Hoje, os atropelamentos são o principal inimigo da fauna. Afetam desde pequenos mamíferos até animais grandes, como antas e tamanduás. É uma tragédia silenciosa, que acontece todos os dias nas estradas e corta a vida onde ela tenta resistir.”
Os acidentes acontecem principalmente à noite, nas rodovias que cortam áreas de mata. “Muitos motoristas nem percebem o que atropelaram. Mas o impacto é enorme. É como se uma estrada cortasse o coração da floresta”, explica o biólogo, com expressão grave.
Cada espécie é uma peça do motor da vida

O silêncio entre as árvores é interrompido apenas pelo som do vento. Giba para, olha ao redor e compara: “A natureza é como um carro cheio de peças. Se você tira uma, o carro dá problema. A gente não sabe exatamente o tamanho do impacto, mas ele acontece.”
Essa metáfora traduz o conceito de equilíbrio ecológico. Nenhum animal existe isolado. Um depende do outro, e todos dependem da floresta. Quando uma espécie desaparece, o sistema entra em colapso.
“É por isso que o trabalho de preservação precisa ser coletivo”, reforça o biólogo. “Cada pegada, cada som, é uma lembrança de que a vida ainda está aqui, e de que a gente precisa continuar lutando por ela.”
O trabalho da Fujama: ciência e resgate

O telefone da Fujama toca com frequência. Do outro lado, quase sempre, alguém liga para avisar: “Tem um bicho machucado aqui”. Giba e a equipe se deslocam, às vezes à noite, para resgatar o animal. “Fazemos o resgate, o atendimento e, se possível, devolvemos à natureza”, explica.
Além dos resgates, a Fujama atua em licenciamento e fiscalização ambiental, ações que, mesmo indiretas, garantem a proteção do habitat dessas espécies. E há também o trabalho de base, o mais importante de todos: a educação ambiental. “Quando a pessoa conhece o que existe aqui, ela passa a cuidar. A informação desperta responsabilidade.”
Nas escolas, nas trilhas e nas redes sociais, a fundação tenta despertar curiosidade. “A gente quer que as pessoas sintam orgulho dos animais daqui. Que entendam que preservar não é coisa distante, é parte da vida da cidade.”
A força da comunidade: o papel de cada cidadão

Proteger a fauna é um compromisso coletivo. “Cada morador pode ajudar”, diz Giba. Ele lista gestos simples: não praticar caça, não comprar animais silvestres, não manter bichos nativos como pets e denunciar crimes ambientais. “Parece pouco, mas isso muda tudo.”
Jaraguá tem uma rede de cidadãos atentos, e cada denúncia conta. Quando a comunidade participa, os resultados aparecem. “A natureza devolve em dobro”, resume o biólogo.
Ele acredita que a empatia é o primeiro passo. “O que a gente conhece, a gente protege. O que a gente ignora, a gente perde.”
Há esperança: onde a vida resiste, há caminho

Apesar dos riscos, Giba acredita que é possível reverter o quadro. “Muitas espécies podem se recuperar. Não é fácil, mas é possível”, afirma. Algumas, naturalmente raras, sempre terão populações pequenas. Outras, afetadas pela ação humana, respondem bem quando a floresta volta a crescer.
Ele lembra de um registro recente de pumas em áreas antes degradadas. “Isso mostra que, quando damos espaço, a natureza responde. Ela quer viver.”
O otimismo é discreto, mas firme. “O futuro depende das nossas escolhas de agora. A vida tem uma força imensa, só precisa de chance.”
Uma cidade privilegiada pela natureza

Jaraguá do Sul é um mosaico de matas, morros e rios. “Poucas cidades do mundo têm tanta biodiversidade em tão pouco espaço”, afirma Giba. São centenas de espécies de plantas e animais que convivem próximas a áreas urbanas, um contraste raro e valioso.
Mas ele alerta: o privilégio exige responsabilidade. “A conservação só acontece quando a comunidade entende o que tem. Quando conhece, cuida.” É por isso que o biólogo insiste em transformar ciência em história, e história em consciência.
“Nosso papel é garantir que essa riqueza continue existindo. Que as próximas gerações ainda possam ouvir o canto do gabião e ver a sombra de um puma cruzando a mata.”
Como isso impacta sua vida?
Proteger os animais ameaçados não é apenas defender a fauna, é defender o equilíbrio de Jaraguá do Sul. A anta ajuda a regenerar a floresta. O puma controla populações e mantém o ciclo natural. O gabião espalha sementes. Cada um cumpre uma função invisível, mas essencial.
Quando essas espécies desaparecem, o impacto chega às pessoas. O clima muda, a água escasseia, o calor aumenta. A floresta perde fôlego, e a cidade perde qualidade de vida. “Cuidar dos bichos é cuidar da gente”, conclui o biólogo.
Jaraguá ainda tem tempo, e vida. Cabe a nós decidir se o som da floresta continuará sendo parte do nosso futuro.
Perguntas e respostas:
- Quantas espécies estão ameaçadas em Jaraguá do Sul? Entre 15 e 20, podendo chegar a 30 conforme novos levantamentos da Fujama.
- Quais são as principais causas da ameaça? Atropelamentos, desmatamento, caça e fragmentação das florestas.
- Como a Fujama atua na proteção da fauna? Com resgates, educação ambiental e fiscalização.
- É possível reverter a situação? Sim. Espécies afetadas por ação humana podem se recuperar com tempo e preservação.
Nota da Redação:
Este texto foi produzido a partir de entrevista concedida pelo biólogo Gilberto Ademar Duwe (Giba), diretor da Fundação Jaraguaense de Meio Ambiente (Fujama).
A narrativa em formato de história busca aproximar o leitor da realidade das espécies ameaçadas de Jaraguá do Sul, mas as cenas descritas são recursos literários baseados em relatos e informações reais.
Max Pires
Já criei blog, portal, startup… e agora voltei pro que mais gosto: contar histórias que fazem sentido pra quem vive aqui. Entre um café e um latido dos meus cachorros, tô sempre de olho no que importa pra nossa cidade.