Sônia Pillon é jornalista e escritora, formada em Jornalismo pela PUC-RS e pós-graduada em Produção de Texto e Gramática pela Univille. Integra a AJEB Santa Catarina. Fundadora da ALBSC Jaraguá do Sul.
Coluna: Sonho de bailarina
O grande sonho de Marieta sempre foi ser uma bailarina. E isso desde pequeninha! Ela ficava encantada quando via as apresentações de balé na televisão P&B. Imitava os passos, os giros, os rodopios no palco e se deixava embalar pela melodia clássica. Ah, como ela queria usar aquela malha de…
18/12/2022
O grande sonho de Marieta sempre foi ser uma bailarina. E isso desde pequeninha! Ela ficava encantada quando via as apresentações de balé na televisão P&B. Imitava os passos, os giros, os rodopios no palco e se deixava embalar pela melodia clássica. Ah, como ela queria usar aquela malha de dançarina, a meia branca e as delicadas sapatilhas!
Quando Marietinha passava por uma vitrine de presentes, ficava encantada com as caixinhas de música, especialmente com as que tinham aquela boneca minúscula, que bailava sem parar a um simples movimento de dar corda.
Durante o sono, muitas vezes a lúdica imaginação de menina a conduzia a um palco iluminado, onde ela bailava, bailava e, ao final da apresentação, se emocionava com os aplausos da plateia.
Certo dia, ao acompanhar a mãe, Veridiana, ao clube do bairro, Marieta abriu uma das salas e encontrou um grupo de meninas na aula de balé e ficou deslumbrada. Ao ser descoberta pela professora, corou, se desculpou e fechou a porta. Foi correndo procurar a mãe para contar a novidade.
– Mãe! Tem aula de balé aqui! Eu quero fazer balé também!
– Marieta, vamos falar com o teu pai primeiro…
Os olhos de Marieta brilharam de esperança. Mas a alegria durou pouco. O pai, João, que recebia um modesto salário trabalhando na indústria, ficou com o semblante triste. A colocou no colo e explicou que haviam muitas despesas para arcar. Que ele sentia muito, mas naquele momento não tinha condições de realizar o sonho da filha. Argumentou que não dispunha de recursos suficientes para bancar as aulas e tudo o mais que envolvia para mantê-la em uma companhia de dança.
Os olhos de Marieta se encheram de lágrimas. Irritada com a negativa, foi para o quarto e bateu a porta, dizendo que nunca mais queria falar com o pai.
Desolado, João, soltou um longo suspiro. Como explicar para a filha, de apenas cinco anos, que além do aluguel do apartamento onde moravam e todas as demais despesas para manter a família, ainda pagava a prestação da casa própria?
Os anos foram passando e o sonho de bailarina de Marieta ficou para trás, em algum canto da memória. Os estudos, a carreira, a vida, enfim, tudo seguiu em frente.
Como mãe, e mais tarde como avó, Marieta viu o sonho de criança se realizar naquela tarde de dezembro. Ao buscar a neta Luana, deslumbrante no traje azul de bailarina, o tule esvoaçante, com maquiagem luminosa, tiara de princesa e a sapatilha de cetim, a alegria não coube no peito! E quando as cortinas do palco da Sociedade Cultura Artística se abriram e ela entrou saltitante, com movimentos leves e graciosos, Marieta não conseguiu segurar as lágrimas. Abanava para ela, se jogava para frente da cadeira, mesmo sabendo que a neta não tinha como a enxergar do palco. Ali estava Luana, tão pequena, linda, radiante, realizando o sonho de bailarina! Era como se Marieta também estivesse realizando o seu próprio sonho, finalmente descortinado depois de décadas.
*Conto inspirado na apresentação de balé da minha neta, Luna.