Jaraguá sem postes e fios? Por que a cidade ainda não tem cabeamento subterrâneo
Jaraguá do Sul enfrenta desafios no custo e regulamentação para adotar cabeamento subterrâneo, mas o investimento traria benefícios estéticos e urbanos.
Foto: Montagem comparativa mostra o centro de Jaraguá do Sul com e sem cabos aéreos
Ao longo dos últimos anos, o debate sobre redes subterrâneas substituindo postes e emaranhados de cabos vem ganhando espaço no Brasil, com diversas cidades adotando esse modelo. Em Jaraguá do Sul, a solução já foi aplicada em pequena escala no calçadão central há mais de 20 anos e, agora, volta a ganhar força nas discussões sobre modernização e valorização da cidade. No entanto, esse avanço ainda enfrenta entraves técnicos, econômicos e políticos.

Comparação na via verde mostra o lado direito sem fios, destacando a diferença visual em relação ao lado com postes e cabos.
O custo que pesa no orçamento
O principal obstáculo apontado por construtoras, prefeitura e pela própria Celesc é o custo de implantação. Construir redes subterrâneas pode custar de cinco a dez vezes mais do que a rede aérea. Em Santa Catarina, a estimativa da Celesc é que 1 km de rede aérea custe cerca de R$ 150 mil, enquanto o mesmo trecho subterrâneo pode ultrapassar R$ 1,7 milhão.
Em novos loteamentos, o impacto também é significativo: o acréscimo no custo de infraestrutura pode chegar a 30%. Para o presidente da Câmara, Luís Fernando Almeida, é preciso enxergar o tema como um investimento estratégico e não como gasto supérfluo.
“Vejo o cabeamento subterrâneo não apenas como uma questão estética, mas como um investimento estratégico em segurança, resiliência e modernidade para a nossa cidade. É fundamental que comecemos por regiões estratégicas, como o centro, áreas de grande fluxo turístico ou novos loteamentos. A legislação deve ser progressiva, estabelecendo diretrizes claras para a transição do sistema aéreo para o subterrâneo, incentivando a adesão e garantindo a segurança e a padronização das instalações”, diz Almeida.

O empresário do setor imobiliário Luiz Sérgio Pereira Junior, responsável pela Engetec Imobiliária, confirma que a demanda já existe, especialmente para empreendimentos de maior poder aquisitivo que buscam um conceito mais ‘limpo’ no visual. Contudo, ele também explica que a instalação do cabeamento subterrâneo tem um impacto significativo no custo final dos empreendimentos.
“Em loteamentos normais, a rede subterrânea de alta tensão (como transformadores e seccionadores abaixo da calçada) pode ser de 10 a 20 vezes mais cara do que a rede aérea”, detalha o empresário.
Conteúdos em alta
Apesar do custo elevado, ele destaca que, em novos empreendimentos, o custo maior de instalação é muito mais vantajoso do que a troca futura de redes aéreas para subterrâneas.
“Embora o custo inicial seja mais alto, é muito mais barato do que fazer a troca no futuro. Isso porque a manutenção das redes aéreas, além de cara, demanda mais intervenções e prejudica a estética da cidade”, enfatiza Luiz Sérgio.
Muito além da estética

Para o presidente da CDL, Paulo Roberto Schwarz, a pauta está ligada diretamente à vitalidade do comércio e à atratividade da região central.
“O tema ‘fiação subterrânea’ sempre permeia os sonhos e projetos que a CDL tem para uma região central forte e revitalizada, e, consequentemente, para um comércio pujante. No Brasil, ainda não temos a cultura de investir no enterramento da fiação elétrica, mas o calçadão de Jaraguá do Sul teve o privilégio de ser contemplado com fiação subterrânea há mais de 20 anos.”
Ele afirma que a expectativa é de que, no futuro, novas ruas também possam receber esse tipo de adequação e, portanto, possam se alinhar a um modelo urbanístico que contemple a fiação subterrânea.
“Reduzir a poluição visual, melhorar passeios públicos, plantar árvores e trazer um modelo mais moderno de cidade. É fundamental que esses projetos avancem para que Jaraguá mantenha sua capacidade de gerar negócios e preserve o atrativo das ruas centrais para o comércio”, destaca o presidente da CDL.
Já o arquiteto Renato Escobar traz outra perspectiva importante sobre os benefícios estéticos e urbanísticos da fiação subterrânea:
“A ausência dos postes e fiações permite que os usuários da cidade possam aguçar seus sentidos, especialmente a visão, e apreciar uma paisagem mais limpa, organizada e harmônica. As ruas ficam mais destacadas, com calçadas, avenidas e praças ganhando protagonismo. As fachadas das edificações também se tornam mais visíveis, valorizando a arquitetura e os espaços públicos, tornando-os mais convidativos e agradáveis”, pontua.
Ele também ressalta a importância da fiação subterrânea na acessibilidade e mobilidade urbana. Segundo Escobar, o design da cidade se valoriza com a implementação da rede subterrânea, e isso permite uma liberdade espacial mais democrática, além de facilitar a circulação de pedestres e motoristas.

Planejamento e ordenamento
O secretário de Planejamento e Urbanismo, Anselmo Ramos, reconhece que a sobrecarga visual e estrutural dos postes é um problema crescente.
“O cabeamento subterrâneo é uma alternativa interessante, especialmente para a transmissão de dados por fios e fibra ótica. Hoje, muitos postes já estão sobrecarregados de cabos, inclusive fios inativos, fruto da obsolescência rápida desse sistema. Isso prejudica o visual da cidade e interfere nas árvores, que precisam de podas mais radicais por causa da rede aérea”, afirma.
Ele, porém, alerta que a implantação subterrânea precisa ser planejada para não gerar conflitos com outras infraestruturas.
“Há interferências com passeios, árvores, sistemas de drenagem, abastecimento de água e gás. É mais um elemento a ser acomodado na calçada. Precisamos criar regras, metodologia de licenciamento e exigência de licenças de obra para cada concessionária, de forma que possamos mapear e coordenar essas redes. O objetivo é ter uma cidade visualmente mais bonita, mais limpa, com menos interferência visual e melhor organização técnica”, enfatiza o secretário.

O que diz a Celesc?
De acordo com a Celesc, a implantação de redes subterrâneas é avaliada com base em critérios técnicos, operacionais e econômicos, sempre dentro das regras definidas pela ANEEL.
“Hoje, esse tipo de rede é indicado apenas para locais onde não haja necessidade frequente de intervenções, como centros históricos ou áreas com restrições urbanísticas, devido ao elevado custo operacional de alterações na infraestrutura. A ANEEL não reconhece redes subterrâneas como investimentos prudentes devido ao alto custo, o que limita a viabilidade de projetos em vias públicas sem aporte externo.”
Conforme a Celesc, os custos de implantação podem chegar a dez vezes o valor de uma rede aérea convencional. A autarquia ainda destaca que, para qualquer solicitação de obra, o cliente interessado é responsável pelo custeio integral da obra, com custos que podem ser rateados entre as partes envolvidas.

O que Jaraguá pode aprender com outras cidades
Em Joinville, um projeto concluído em 2016 enterrou 2,4 km de fiação no centro histórico, com investimento de R$ 9,2 milhões. Houve ganho estético e redução das quedas de energia. Em Itajaí, um trabalho iniciado em 2019 está substituindo 4 km de rede aérea, com orçamento de R$ 37 milhões e apoio de empresas internacionais.
Fora de Santa Catarina, São Paulo enterrou menos de 1% de sua rede elétrica, devido ao custo e à complexidade logística – para enterrar apenas o centro, seriam necessários mais de R$ 20 bilhões. Paris, por outro lado, tem 100% da rede subterrânea desde os anos 1960, resultado de décadas de planejamento. Já Buenos Aires mantém o centro com rede enterrada desde os anos 1950 e, desde 2005, proíbe novos cabos aéreos em várias zonas.

Pensar no futuro
Para Luís Fernando Almeida, a meta deve constar nos planos diretores e guiar todas as futuras expansões urbanas.
“O enterramento da fiação não deve ser visto como projeto isolado, mas como meta estratégica incorporada nos planos de desenvolvimento urbano de Jaraguá do Sul, tanto em médio quanto em longo prazo. Podemos estabelecer metas progressivas, definindo prazos e áreas prioritárias, garantindo que a cidade cresça de forma ordenada, moderna e com uma infraestrutura de ponta.”
Paulo Roberto Schwarz reforça que a CDL continuará defendendo a proposta junto ao poder público e à sociedade. “Mantemos conversas constantes com a Prefeitura Municipal de Jaraguá do Sul, sempre com o objetivo de incentivar e cobrar a inclusão desse tipo de proposta nos projetos de modernização da região central.”
A discussão segue aberta, mas há um consenso entre os diferentes setores: a mudança exige planejamento, legislação adequada e, principalmente, vontade para transformar um desejo antigo em realidade.
Como isso impacta sua vida?
A decisão sobre investir em cabeamento subterrâneo em Jaraguá do Sul vai muito além da estética. Ela envolve custos altos, mas também traz ganhos de segurança, valorização imobiliária e qualidade urbana. Para os moradores, significa pensar em uma cidade mais moderna e organizada — mas que exige planejamento e escolhas estratégicas.
Max Pires
Já criei blog, portal, startup… e agora voltei pro que mais gosto: contar histórias que fazem sentido pra quem vive aqui. Entre um café e um latido dos meus cachorros, tô sempre de olho no que importa pra nossa cidade.