A história d’O Leopoldo, primeira celebridade da internet jaraguaense
Foto: arquivo pessoal
Sabe quando você abre o Instagram e parece que todo mundo é influencer? Pois é… fácil falar hoje, com celular no bolso e internet voando. Mas volta comigo uns 25 anos no tempo. Vamos parar no ano 2000 – aquele mesmo da virada de século, do bug do milênio e da música da Britney tocando nas rádios.
A internet brasileira ainda estava engatinhando. Aqui em Jaraguá do Sul, então, era quase um bebê de fraldas. E foi justamente nessa época que nasceu O Leopoldo, o primeiro grande fenômeno digital da cidade. Sim, Jaraguá teve uma celebridade online antes mesmo do Facebook existir. E eu estava bem no meio dessa história.
Como era o mundo online naquela época
Pra começar, não tinha essa de Wi-Fi. A gente se conectava na tomada do telefone, com aquele som metálico que parecia que a nave espacial ia decolar: piiiii-krkrkrk-tchhh. E cada minuto online era um olho da cara na conta de telefone no fim do mês.

O Brasil já tinha alguns portais grandes – UOL, Terra, o extinto Zaz – e novidades como o Zipmail, que era o primeiro e-mail grátis. Ah, e claro, o ICQ… se você lembra do “Oh-oh!”, já entregou a idade.
Aqui em Jaraguá, a internet vinha basicamente da Netuno, nosso provedor local. E, pasme, já tínhamos até uma produtora web, a WEBWork, que fazia sites para empresas da região.

O começo: uma folha de papel e um sonho
Eu estava desempregado, mas com uma ideia fixa: criar um portal para jovens, com agenda de eventos, notícias, colunas e fotos. Tudo que eu tinha era uma folha de papel com o esboço do site.
Conteúdos em alta

Com essa folha na mão, fui atrás de quem acreditasse na ideia. O primeiro a topar foi Helio de Masi, da Netuno, que ofereceu hospedagem e criação. Depois veio a Heloisa Peters, dona da Loja.com, que patrocinou o projeto antes mesmo de ele existir.
E o nome?
Pedi ajuda ao amigo Marcio Martins. Entre várias opções, surgiu “O Leopoldo”. Era simples, fácil de lembrar e, o melhor, deixava todo mundo intrigado: Quem é o Leopoldo?
O logo foi criado por Fernando Robl, que acabou virando meu sócio. E pronto: a base estava montada.

O lançamento e o agito nas festas
A divulgação? Total raiz: flyers impressos, distribuídos nas festas e baladas. A câmera digital? Doze fotos, no máximo. Eu ia ao evento, fotografava, corria pra casa do Fernando, descarregava e subia pro site.
E não demorou pro Leopoldo virar febre. As fotos bombavam, mas o que realmente explodiu foi o mural de recados.

O mural: nosso Facebook de 2000
Qualquer um podia escrever ali – com ou sem nome. Eram recados, indiretas, flertes, tretas… e, no começo, eu mesmo inventava conversas usando nomes diferentes só pra animar o povo. Funcionou! Muita gente colocou o mural como página inicial do navegador.

Curiosidades que valem lembrar
• Celular com câmera? Só nos filmes de ficção científica.
• Pontos de encontro: Café Confusão e Notre eram cenário de muita foto d’O Leopoldo.
• Tempo é dinheiro: literalmente, cada minuto online custava na conta do telefone.
• ICQ bombando: todo mundo tinha um número e sabia ele de cor.
As pessoas por trás do Leopoldo
O Leopoldo não era só um site. Ele era feito de gente – e gente incrível.
Foi nessa época que conheci o Thiago Markiewicz, com uns 13 ou 14 anos. Ele me mandou uma mensagem no ICQ dizendo que adorava o site e queria trabalhar comigo (de graça). Contratei na hora! O Thiago foi meu amigo durante toda a vida, sempre presente nas minhas loucuras, até o dia em que, infelizmente, nos deixou. Mas o que a gente viveu junto segue vivo na minha memória.


Tinha também a Valdirene Martins, irmã do Marcio, que cozinhava como ninguém. Todos os dias eu almoçava com ela – e ela nunca me cobrou nada. Era carinho e apoio pra continuar.
O Kledir Barkemeyer era nosso mago da programação. Sempre aparecia com uma novidade pro site, um recurso diferente, algo que deixava o Leopoldo mais moderno.
Eu cuidava de quase tudo: fazia as fotos, editava o site, vendia anúncios, fechava parcerias e corria atrás de tudo que pudesse fazer o projeto decolar.

E o Marcio Martins não só inventou o nome do Leopoldo, como escrevia várias reportagens e me ajudava a transformar ideia em texto. E é qqui que entra um depoimento dele, que resume bem essa parceria e a dimensão do que foi o Leopoldo:
“Havia tempos que queria escrever isso, mas escrevemos história, fizemos história. Até hoje, nos trabalhos de naming para que sou contratado, uso como referência de sucesso. Apresentei vários nomes na época – como ‘Caverna’ e ‘Cogumelo’ – mas defendi ‘O Leopoldo’ porque era um nome adulto para um site jovem, e isso ia chamar atenção.
Apesar de não ser um produto lucrativo, tivemos grandes experiências. Entrevistamos artistas como Papa Winnie e Fernanda Takai, fizemos campanhas que esgotaram ingressos e vimos o mural bombar com grupos como ‘Senhoritas’ e ‘A.M.I.G.A.S’.Com pouco capital, entregamos um produto de alto nível. A ideia dos flyers foi genial — as pessoas recebiam o endereço e corriam para procurar na internet. Ainda teve sorteio de produtos e uma galera que se envolveu para fazer acontecer. Foi um trabalho incrível.”
Nem tudo era festa
Com uma grande audiência vieram também os problemas. Como o mural permitia postagens anônimas, muita gente começou a usá-lo para ofensas e ataques. No começo, confesso, até tinha graça – era o tempero das tretas locais. Mas, com o tempo, os comentários pesados passaram a dividir espaço com as interações saudáveis.
E aí não tinha jeito: eu e o Thiago passávamos horas, em qualquer horário do dia ou da madrugada, apagando mensagens e tentando manter o ambiente minimamente civilizado.
Foi nesse período que abriu em Jaraguá um escritório do Portal Terra. Eu vi ali uma chance ousada: queria levar o Leopoldo para dentro de um dos maiores portais do Brasil. Fui bater na porta deles com minha proposta de parceria – não para vender o Leopoldo, mas para que o nosso conteúdo fosse chancelado e publicado no Terra, ampliando o alcance de algo que, até então, era totalmente local.
Lembro de pensar quais argumentos usar. Como convencer que um site nascido em Jaraguá do Sul poderia fazer diferença num gigante da internet nacional?
O Leopoldo não entrou no Terra, mas o Terra acabou me levando para outro caminho. A responsável pelo escritório era amiga do dono da Look Here, um portal de Joinville que produzia conteúdo com um perfil muito parecido ao que eu fazia. O convite veio e, embora não fosse o que eu tinha imaginado, fez todo sentido na hora.

Não foi fácil “matar meu filho”. O Leopoldo era meu trabalho, minha criação e, de certa forma, parte da minha identidade. Muita gente na cidade me chamou de traidor, achando que eu tinha “vendido” o projeto. Mas a verdade é que eu sabia que sozinho não conseguiria manter a estrutura que o site precisava para continuar crescendo.
A Look Here oferecia exatamente o que eu precisava: infraestrutura, marca consolidada, equipe, suporte técnico e uma rede de contatos que poderia levar meu trabalho para outro patamar. Aceitar significava abrir mão do controle total, mas também era a chance de evoluir.
Foi, acima de tudo, um ato de coragem. Um capítulo que encerrou uma fase incrível e abriu portas para novos desafios.

O legado que ficou
O Leopoldo o lugar onde Jaraguá aprendeu a se conectar, onde amizades nasceram, onde a vida social da cidade ficou registrada.
Recentemente, consegui registrar o domínio de novo. Quem sabe um dia ele não volta?
Como isso impacta sua vida?
A história do Leopoldo é um lembrete de que a internet não começou nas redes sociais. Antes do like e do compartilhamento, já existiam conexões reais feitas no mundo virtual. E, em Jaraguá do Sul, isso começou com um nome misterioso, um mural de recados e uma cidade inteira curiosa pra saber: Quem é o Leopoldo?
Max Pires
Já criei blog, portal, startup… e agora voltei pro que mais gosto: contar histórias que fazem sentido pra quem vive aqui. Entre um café e um latido dos meus cachorros, tô sempre de olho no que importa pra nossa cidade.