Quem é o homem que canta ópera todos os dias no centro de Jaraguá do Sul?
Francisco Salles, o 'Pavarotti Paraense', se apresenta em praça de Jaraguá do Sul, transmitindo sua arte. | Foto: André Marques/JDV
Se nos últimos tempos você passou pela Praça Ângelo Piazera, no centro de Jaraguá do Sul, provavelmente já ouviu ele. É difícil não notar: uma voz potente, que ecoa entre os prédios, cortando o barulho do trânsito com notas que parecem saídas de um teatro europeu.
Muita gente para, grava, aplaude. Mas quase ninguém sabe quem é o homem por trás daquela voz.
Francisco Salles Palheta da Luz canta ali quase todos os dias. Não tem caixa de som, nem figurino de gala. Apenas ele, a voz e uma missão. Aos 61 anos, o paraense de Curuçá carrega no peito o apelido de “Pavarotti Paraense” e, nas costas, uma história de luta.

A história do ‘Pavarotti Paraense’ que encanta Jaraguá do Sul
Antes de ser cantor de praça, Francisco foi militar da Aeronáutica e depois da Polícia Militar do Pará. Hoje, trava na Justiça a batalha pelo direito à aposentadoria que nunca veio. E a música, que esteve presente na sua vida desde a infância, agora é mais do que um refúgio: virou sustento.
O apelido nasceu aos 39 anos, dado por um sobrinho famoso – o Sousa, lateral esquerdo do Paysandu Sport Club e campeão dos campeões. “Foi ele que me chamou de Pavarotti pela primeira vez. Por causa da potência dos agudos”, lembra Francisco.

Com o tempo, a voz que impressionava em casa passou a ecoar nos espaços públicos de Belém. Se apresentou na Praça Batista Campos, no Mercado Ver-o-Peso, em eventos, festas e até no programa do Faustão, segundo ele.
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“Mas o povo da rua é o melhor público. É ali que você toca de verdade as pessoas.”
A música como fonte de sustento para o neto
Há um ano, Francisco chegou a Jaraguá do Sul atraído pela segurança, limpeza e pelas oportunidades. Se instalou e, como sempre fez, escolheu a praça para cantar. Hoje, faz parte da paisagem sonora do centro. Mas o que poucos sabem é que, por trás de cada música, existe um motivo ainda maior.

Francisco canta para ajudar a sustentar o neto, uma criança com autismo. “O governo federal cortou o benefício dele e o meu. A gente recebia Bolsa Família, agora só temos o BPC Loas, e o meu vem com desconto. Recebo menos da metade. Então canto todos os dias para garantir o alimento dele.”
A rotina com o neto exige atenção e cuidado. “Levo pra escola, cuido da segurança, da alimentação, do lazer. E canto. Canto porque é o que sei fazer de melhor.”
O sonho de aprender, ensinar e viver da música
Quanto ao talento e a paixão pela música, uma coisa o público pode ter certeza, o repertório é nobre: “Nessun Dorma”, “Con Te Partirò”, “Caruso”, “Ave Maria”, “La Vie en Rose”, “Quizás, Quizás, Quizás”. Mas a inspiração vem de algo muito maior.
“Deus. É Ele que me dá força. Algumas óperas me ajudam a me ligar com o Pai celestial.”

Quando perguntado sobre sonhos, Francisco não titubeia: “Quero estudar música na Europa. Para ensinar de graça. Para passar adiante.”
E é a fé que sustenta tudo, não somente os sonhos, mas a determinação e luta diária. “Com muita fé em Deus, sigo em frente. E desejo que Deus abençoe a todos que param para ouvir, que livre de todo o mal.”
Para algumas pessoas, Francisco pode representar mais um rosto presente na correria do centro. Mas quem para para ouvi-lo, descobre mais que uma voz potente: encontra um homem que canta por amor, por necessidade e por fé.
O que o futuro reserva para este artista apaixonado pela música ainda é um mistério, mas, por enquanto, entre uma canção e outra, ele continua a transformar a praça em um espaço que muitas grandes cidades já perderam: um local de encontro, silêncio, escuta e pura expressão artística.
E assim, mesmo sem os holofotes, sua arte já é um espetáculo por si só.
Max Pires
Já criei blog, portal, startup… e agora voltei pro que mais gosto: contar histórias que fazem sentido pra quem vive aqui. Entre um café e um latido dos meus cachorros, tô sempre de olho no que importa pra nossa cidade.