A maldição do traje: Com que roupa eu vou?
A Cohab era um conjunto habitacional de casas populares padronizadas. Cada cinco quadras/quarteirões tinha a mesma cor nas janelas: verde, vermelha, amarela… Meu primo, Flávio, morava lá, nas “azuis”. Embora vivesse naquele lugar de pessoas de mesma classe social, ele vestia-se como se fosse o dono do bairro. Só percebi lá pela terceira vez que saímos juntos, na adolescência, para dar uma volta no centro da cidade.
Não sei se é uma falsa memória, lembro que ligava para ele e perguntava a roupa que ele usaria, para ir em um naipe meio parecido.
Tenho um amigo, o José Marcelo, que também andava sempre bem alinhado. Eu achava que ele era rico, quando o conheci. Depois, passamos a conviver de perto, no time de futebol, descobri que ele tinha um look só e que ia revezando com os amigos, sua calça, camisa e sapato. Ainda bem que nossos tamanhos eram diferentes, nunca precisei emprestar-lhe minha camisa Pool, vermelha.
Fiquei com a mania de combinar o que vestir, até hoje. Inclusive no trabalho, quando tenho viagens: “Com qual traje vamos?” e brinco: “Não dá para ir vestido como se um trabalhasse para o outro”. Não é uma regra perfeita. Só caio em armadilhas.
No aniversário da minha avó, a Maria, todos os primos trabalhados na roupa social e eu, na foto oficial dos netos com camiseta de super-herói.
Em uma festa de quinze anos, em Curitiba, o convite citava traje esporte chic. Quando cheguei lá, todos estavam de terno e gravata, inclusive a minha prima, Alessandra. E eu de “manga de camisa” (sem blazer) como dizia minha avó, a “portuguesa” Doralice.
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Em um casamento, em Brasília, perguntei detalhes sobre o traje, já que o convite trazia apenas: Boho-chic. Traumatizado, convenci minha mulher de irmos de traje social completo. E Estavam todos assim. Mas o plano, foi quase perfeito, conseguimos acertar exatamente a cor que os padrinhos e madrinhas estavam vestindo. O noivo até tinha falado na cor que eles usariam. Mas falou um nome complexo, uma cor meio dúbia, quando na verdade, estavam todas as testemunhas usando camisas e vestidos azuis-calcinha, e nós também.
Houve um casamento corporativo – aquele que vai todo mundo e você acaba ficando na mesa de quem você só suporta porque é remunerado – e o convite moderno tinha um link com sugestão de trajes, que traziam bermudas, saias e tênis, pois seria no verão e em um sítio. Já tínhamos separados as roupas, mas um problema de saúde nos impediu de ir. Foi bom. Os stories só trouxeram pessoas de calças, cabelos escovados e saltos altos.
Há uma foto naqueles álbuns antigos, de 1985, na qual todas as crianças da vila estão fantasiadas para o Carnaval, eu apareço, na faixa dos dez anos de idade, à paisana, de calção e camiseta. Fui contrariado, não gostava da festa, mas tinha que ir para “cuidar” da irmã, mais nova, no agitado evento de Pelotas/RS.
Quando mudei para Jaraguá do Sul, resolvi passar o fim de semana do Carnaval com meus tios, em Florianópolis. Minha prima adolescente negociava com o pai a liberação para ir com as amigas ao desfile: “Só vais se o teu primo te levar”. Já que eu estava hospedado no apartamento deles, tive que ir. O destino não havia me liberado da maldição do Carnaval. E o traje? Adivinhe.
Tenho um conhecido, o Juarez, que está sempre de camisa polo preta. Ele nunca cai em armadilhas.
Marcelo Lamas
Marcelo Lamas Cronista, autor de 4 livros. Sou gaúcho radicado em Jaraguá, há 3 décadas, porém, estou mais para jaraguaense, nascido no RS. Frio, doces, cafés, gatos, livros, futebol e Coca-Cola são as minhas preferências.