Universidade Gratuita e Fumdesc: suspeitas de irregularidades atingem 18 mil bolsistas, aponta TCE

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Um dos programas mais emblemáticos da educação em Santa Catarina está agora no centro de uma análise criteriosa. Um levantamento do Tribunal de Contas do Estado (TCE/SC) identificou indícios de irregularidade em 18.383 bolsas concedidas por meio dos programas Universidade Gratuita e Fumdesc, o que pode representar um risco financeiro de até R$ 324 milhões aos cofres públicos.
As informações foram apresentadas nesta quarta-feira (12) durante sessão do Tribunal. Segundo o relator temático da Educação, conselheiro substituto Gerson dos Santos Sicca, o objetivo da análise não é desmerecer a política pública, mas oferecer dados que ajudem a evitar distorções na seleção dos beneficiários.
“A clareza sobre os objetivos da política pública é determinante para a fixação de bons critérios de seleção, que evitem injustiças”, afirmou.
Renda e patrimônio incompatíveis
O cruzamento de dados da Secretaria de Estado da Educação revelou inconsistências em diversas frentes. Em 4.430 casos, a renda declarada não se enquadra nos critérios do programa; em 15.281, foram identificadas divergências patrimoniais. Há ainda 1.699 registros sem comprovação de vínculo empregatício e 335 estudantes que não moram ou não são naturais de Santa Catarina.
Ao todo, foram analisados cadastros de 34.254 alunos matriculados no primeiro e no segundo semestre de 2024. A investigação utilizou bases complementares para verificar se os estudantes realmente atendem às exigências previstas e se o processo de concessão das bolsas está sendo conduzido de forma justa e transparente.

Impacto direto sobre estudantes mais vulneráveis
O presidente do TCE/SC, conselheiro Herneus De Nadal, foi enfático ao destacar o prejuízo que possíveis fraudes causam aos estudantes mais necessitados.
“Quando esse índice é alimentado com dados que não correspondem à realidade, quem mais precisa acaba ficando de fora. É isso que queremos evitar.”
Segundo ele, os indícios apontados serão aprofundados em parceria com outros órgãos, como a Secretaria da Educação, a Controladoria-Geral do Estado, o Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) e a Receita Federal, para garantir responsabilização nos casos confirmados.
Estado deve aprimorar mecanismos de controle
O diretor-geral de Controle Externo do TCE/SC, Sidney Tavares Júnior, ressaltou a importância de fiscalização contínua e critérios bem definidos para evitar que estudantes fora do perfil socioeconômico ocupem vagas de quem realmente necessita. Os casos mais relevantes identificados serão encaminhados ao MPSC para investigação.
Além disso, o Tribunal também está analisando os controles aplicados pelas instituições de ensino e pelo próprio Governo do Estado. Em 2024, foram verificados 131 cursos de 174 polos distribuídos em 59 instituições, dentro do processo que busca compreender como está sendo feita a seleção dos bolsistas.
Responsabilidade compartilhada
Para o conselheiro José Nei Ascari, vice-presidente do TCE/SC, os problemas não se restringem a eventuais fraudes cometidas pelos alunos. “Parece igualmente claro que há falhas no próprio processo de concessão e fiscalização, atribuídas tanto às instituições educacionais quanto ao governo”, pontuou.
Já o conselheiro Aderson Flores destacou a necessidade de revisar a forma como é calculado o índice de carência — critério usado para definir quem tem direito à bolsa. Para ele, esse aprimoramento depende da atuação conjunta dos Poderes Executivo e Legislativo, além de uma revisão administrativa na Secretaria de Educação.
Comparação com o Bolsa Família
O conselheiro substituto Cleber Muniz Gavi comparou a situação com a auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) no Bolsa Família em 2023.
“O que se vê nessas políticas públicas é que a fiscalização e o monitoramento precisam ser constantes. Isso ajuda o próprio Executivo a aprimorar o sistema.”
Segundo ele, embora as inconsistências levantadas sejam relevantes, a principal contribuição do TCE neste momento é fornecer subsídios técnicos para o aperfeiçoamento do programa, garantindo que os recursos cheguem, de fato, a quem mais precisa.