Esportes | 10/10/2025 | Atualizado em: 10/10/25 ás 09:14

Como o Jaraguá Futsal fez da saúde mental um pilar para se manter na elite do esporte

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Como o Jaraguá Futsal fez da saúde mental um pilar para se manter na elite do esporte

Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

Em uma modalidade como o futebol de salão, onde a intensidade não dá trégua e um campeonato pode ser decidido nos detalhes, manter a mente no lugar certo é tão importante quanto acertar um chute. Foi com essa visão que o Jaraguá Futsal fez uma escolha ainda incomum no cenário esportivo brasileiro: cuidar da saúde mental dos atletas com a mesma prioridade dada aos preparos físico e técnico.

Desde setembro de 2024, a psicologia esportiva passou a fazer parte da rotina do clube com a chegada de Erika Melina Urbano, especialista em Psicologia do Esporte e Terapia Cognitiva de alto rendimento. Ela se integrou à comissão técnica como peça estratégica ao bem-estar de cada pessoa que veste a camisa amarela e preta.

Psicóloga Érika Urbano do Jaraguá Futsal na quadra da Arena Jaraguá
Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

Para entender como essa mudança ganhou forma dentro e fora de quadra, ouvimos a própria Erika, o capitão Leco e o técnico Xande Melo. Juntos, eles compartilham como o cuidado com a mente passou a fazer parte da engrenagem que move o Jaraguá Futsal hoje.

>> O conteúdo se conecta com o Dia Mundial da Saúde Mental, celebrado neste 10 de outubro, e propõe uma pausa para refletir sobre equilíbrio e bem-estar na vida e no esporte.

Psicologia na beira da quadra

Presente em treinos e jogos, Erika se tornou parte essencial da equipe. Seu trabalho, no entanto, vai além do ambiente esportivo; ela atua como um elo entre atletas, comissão técnica e diretoria, participando de decisões, conversas e dinâmicas que visam muito mais do que o desempenho técnico, mas o fortalecimento das relações humanas.

A especialista explica que a psicologia do esporte, dentro de um clube, se faz na beira da quadra.

“Se eu não tiver presente, não crio confiança com o atleta. Preciso entender a rotina, as dificuldades. Então, estar no banco, conversar, observar e intervir quando necessário faz parte do meu trabalho. Todo mundo já entende que, quando sento no cantinho, estou ali para direcionar, acolher ou intervir.”

Psicóloga Érika e técnico Xande trocam observações no banco do Jaraguá Futsal
Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

É essa presença ativa e constante que permite à psicóloga identificar momentos de oscilação emocional no grupo, seja após derrotas, fases difíceis ou jogos decisivos. Ela participa da rotina semanal com reuniões com os atletas, encontros com a comissão e acompanhamento de treinos.

Durante os play-offs, por exemplo, a intensidade dessa presença dela aumenta, e o trabalho com o elenco é reforçado semanalmente.

“Chamamos o grupo à responsabilidade, buscamos entendimento e criamos estratégias. Focamos no processo, não no resultado. O resultado não está sob nosso controle, mas o processo sim. Então a gente trabalha para resolver o que é da nossa alçada”, resume.

Além disso, a rotina mental dos jogadores também é respeitada e estimulada. A psicóloga reconhece e valoriza os rituais individuais, mas também promove ações coletivas, como dinâmicas de fortalecimento de grupo, rodas de conversa, análise SWOT (Forças, Fraquezas, Oportunidades e Ameaças) e práticas de comunicação afetiva entre os atletas.

“Se a gente sabe onde está a fraqueza, podemos nos preparar melhor. Antecipamos o emocional como antecipamos a tática.”

Jogadores do Jaraguá Futsal comemoram durante partida da Liga Nacional
Foto: Paulinho Sauer

O impacto direto no grupo

O reflexo de todo esse trabalho aparece de forma muito clara no dia a dia do clube, principalmente entre os jogadores. Capitão da equipe, Leco relata que sua postura mudou com o acompanhamento psicológico.

“Comecei a refletir mais sobre minhas emoções e sobre o que estava vivendo naquele momento, não apenas no jogo. Isso ajuda a nos equilibrar melhor emocionalmente e, com isso, a performar melhor.”

Ele destaca, ainda, que as dinâmicas em grupo foram fundamentais para fortalecer o elenco. “Essas reflexões nos fazem entender o real motivo do que estamos fazendo ali. A Erika trouxe esse senso de coletividade e consciência. A equipe se uniu ainda mais e começou a remar junta.”

Capitão Leco do Jaraguá Futsal em momento de concentração no vestiário
Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

O técnico Xande Melo compartilha da mesma visão. Para ele, o efeito do trabalho psicológico no grupo foi essencial, e começou na disposição de cada um em se permitir aprender.

“Quando a gente se coloca no lugar do outro, cria uma conexão mais verdadeira e começa a enxergar soluções em vez de problemas. A gente deixa de apontar o dedo e passa a acolher. O objetivo deixa de ser apenas o resultado, passa a ser o processo, a forma como a gente se comunica, abre o coração e se coloca à disposição para ajudar.”

Com uma trajetória pessoal marcada por perdas familiares, ele reconhece a psicologia como uma ferramenta poderosa. “Fui amparado por amigos, professores, psicólogos… Isso me transformou. Quando a gente aprende a se colocar no lugar do outro, tudo muda. Não é só sobre vencer, é sobre como a gente se comunica, se escuta e se fortalece.”

Para ilustrar o impacto desse trabalho da psicologia esportiva na prática, Xande relembra um episódio marcante antes da final da LNF 2024. “Teve um momento em que um dos atletas trouxe, espontaneamente, uma dinâmica feita com a Erika para falar sobre e motivar um companheiro. Foi emocionante. E aquele jogador teve uma atuação brilhante em quadra.”

Técnico Xande com lousa tática explicando jogadas no treino do Jaraguá Futsal
Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

Para Érika, o maior ganho está justamente no coletivo. Ao promover a empatia e o diálogo entre os jogadores, o clube colhe frutos que vão além do placar. “Nosso foco é fortalecer a coesão. Quando os atletas confiam uns nos outros, se respeitam e se comunicam bem, isso impacta diretamente no rendimento. Mas também impacta na saúde emocional deles como seres humanos.”

A psicóloga também atua em momentos sensíveis da vida do atleta, como lesões e transições de carreira. E reforça: seu trabalho depende da integração com os demais profissionais de saúde, como fisioterapeuta e nutricionista. “Nada acontece sozinho. A psicologia é um elo, uma ponte. E é na convivência, na escuta e na confiança que conseguimos construir um ambiente saudável.”

A realidade da psicologia no futsal brasileiro

Mesmo com a crescente valorização da saúde mental no esporte, Erika reconhece que a presença de psicólogos ainda é rara, não só no futsal profissional, mas também em outras modalidades.

“É uma cultura que está mudando aos poucos. Hoje temos quatro ou cinco equipes da Liga Nacional que contam com o apoio de psicólogos. E apenas três com esse profissional integrado à comissão técnica, e uma delas é o Jaraguá”, relata.

Ela explica que ainda existe uma resistência estrutural, alimentada por uma visão equivocada sobre o papel do psicólogo no esporte.

“Muita gente ainda acha que psicólogo é para quem tem problema. Como se buscar ajuda fosse sinal de fraqueza. Mas não é; se você é humano, em algum momento da vida vai ter que lidar com emoções e comportamentos, e a psicologia está aí para isso.”

Apesar disso, ela destaca que encontrou no Jaraguá um ambiente diferente: “Aqui não houve resistência, nem da diretoria, nem dos atletas. Desde o começo, houve abertura para esse trabalho.”

Psicóloga Érika acompanha jogo do Jaraguá Futsal com expressão concentrada
Foto: Paulinho Sauer/Jaraguá Futsal

E a visão que ela traz para o clube é resultado de uma vivência ampla no esporte de alto rendimento. Antes de chegar ao aurinegro, Erika acumulou experiência em diversas modalidades. Mineira, ela é graduada em Psicologia pela Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (2016), com especialização em Psicologia do Esporte e Terapia Cognitiva de alto rendimento.

Já atuou como psicóloga esportiva na Liga Mineira e na Liga Nacional de Judô, além de clubes como o Minas Tênis Clube (futsal, tênis e vôlei de base), Cruzeiro Esporte Clube (futebol de base) e SESI SP/Bauru (categorias de base e profissional, masculino e feminino). Também foi coordenadora de pós-graduação na área de saúde e esporte na FCMMG.

Como isso impacta sua vida?

A história do Jaraguá Futsal mostra que cuidar da mente não é luxo, é estratégia. Em tempos de pressão e resultados imediatos, o clube apostou em relações saudáveis, comunicação honesta e apoio emocional. E provou que isso se traduz em desempenho, união e consistência. Uma lição que vale não só para o esporte, mas para a vida.

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Gabriela Bubniak

Jaraguaense de alma inquieta e jornalista apaixonada por contar boas histórias. Tenho fascínio por livros, música e viagens, mas o que me move é viver a energia de um bom futsal na Arena e explorar o que há de melhor na nossa terrinha.

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